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Prefeitura de Fernandópolis e Estado não vão pagar R$ 45 milhões por respasses obrigatórios



O desembargador Oscild de Lima Junior (foto), da 11ª Câmara de Direito Públicodo Tribunal de Justiça de São Paulo, manteve a sentença da Justiça de Fernandópolis, no bojo de uma ação popular, que obrigaria a Prefeitura de Fernandópolis e o Estado a repassar valores ao Sistema Único de Saúde. Trata-se de ação popular ajuizada por um advogado contra a Fazenda do Estado de São Paulo e o município de Fernandópolis, alegando a falta de repasses obrigatórios, pelo primeiro corréuao segundo corréu, para financiamento do sistema público de saúde,correspondente a 12% do valor arrecadado pela Fazenda Estadual, no município de Fernandópolis, a título de ICMS e IPVA, o que não foi feito nosanos de 2014, 2015, 2016 e 2017. Assim, sustentou que a Fazenda Estadual não cumpriu com o dever legal previsto na Lei Complementar 141/2012, e o Município se omitiu no dever legal de requerer as medidas judiciais cabíveispara buscar o seu cumprimento, bem como a recuperação dos recursos, quesão por direito e por norma constitucional pertencentes ao sistema de saúdemunicipal. Esclareceu que, de acordo com registros apontados no Sistema Datasus (Siops), de R$ 46.955.749,00, apenas R$ 1.026.336,13 foram repassados ao Município, ensejando prejuízo ao erário e a toda sociedade.Requer, pois, a procedência da ação, com o acolhimento da nulidade dos atosadministrativos que convalidaram o não repasse dos recursos previstos para o financiamento do sistema público de saúde, tendo como base os 12%referente aos valores arrecadados com ICMS e IPVA no município de Fernandópolis, para os exercícios financeiros de 2014, 2015, 2016 e 2017, no valor de R$ 45.929.413,87, bem como a nulidade e/ou invalidade de todos os atos posteriores, corrigindo a ilegalidade destes, com a condenação dos réusao repasse ao erário público de Fernandópolis do montante não repassado e utilizado indevidamente.A r. sentença de fls. 26/34 indeferiu a petição inicial,julgando extinto o processo, sem resolução do mérito, com fundamento no art. 332 c/c art. 485, inciso I, ambos do CPC. Corrigiu, de ofício (art. 292,§3º, do CPC), o valor da causa, o qual arbitrou em R$ 200.000,00, visto queapresentado em valor por demais excessivo e que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão. Condenou o autor ao pagamento de multa por litigância de má-fé, na importância de 9,99% do valor da causa, valor a ser revertido em favor de entidade beneficente estabelecida na Comarca de Fernandópolis, devendo o autor, com o trânsito em julgado, proceder à comprovação do pagamento do valor, no prazo de 15 dias, sob pena de cobrança específica. Ademais, condenou o autor, considerando o reconhecimento de sua má-fé, ao pagamento das custas e despesas processuais, observado o disposto no art. 5º, inciso LXXIII, parte final, da Constituição Federal (“ficando o autor,salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência. "Vale dizer, existe obrigação legal de transferência de recursos do Estado para os Municípios, mas não na forma descrita pela petiçãoinicial.Estado deve aplicar, anualmente, 12% do valor arrecadado com impostos emações de saúde e serviços públicos.Porém, o mesmo diploma legal reza, no art. 19, queo repasse aos Municípios deve observar o critério de necessidades de saúde e dimensões epidemiológica, demográfica, socioeconômica e espacial, além da capacidade de oferta de ações e de serviços de saúde, observando a necessidade de reduzir as desigualdades regionais.Portanto, conclui-se que não há obrigação legal do Estado de repassar aos Municípios cota parte de arrecadação sobre impostosestaduais de ICMS e IPVA na importância de 12%. Ou seja, o critério pararepasse não corresponde ao sustentado pelo autor, é muito mais complexo e leva diversos outros fatores em consideração.Além disso, importante salientar que a legislação quedisciplina o SUS, partindo-se desde a Constituição Federal e da Lei Federal nº 8.080/90, é complexa, ainda mais no que se refere ao seu custeiodestacando-se que o próprio Ministério da Saúde detém capacidade normativaindependente para regrar o gerenciamento da saúde pública em todo territórionacional As alegações são tão genéricas que o autor popular,a fim de embasar a presente ação popular, somente apresentou “cálculos de percentual de recursos próprios aplicados em saúde conforme a LeiComplementar 141/2012” , com um cálculo para cada exercíciomencionado, que não estão alicerçados em indícios de dados e provas", justificou o desembargador. .Aliás, segundo ele, em franca análise dos documentos , o juízo em Fernandópolis bem constatou que alguns cálculos juntados se encontram incompletos, suprimindo o 'quadro H', denominado 'controle do valor não cumprido referente ao percentual mínimo em ASPS', na parte finalde cada documento, discriminação na qual poderia se verificar a existência de eventual pendência de valores ."Diante desse contexto, irretorquível a constataçãolançada pela douta Procuradoria Geral de Justiça: a ação é uma aventurajurídica, possuindo propósito confuso e desprovido de argumentação jurídica" Para Oscild Lima, os indícios de prova, além do que não cuidou de atacar ato lesivo e a suanulidade, essencial para a admissão da ação popular ".Se o Estado tivesse deixado de providenciar os repasses/transferências constitucionais e legais ao município para prover a saúde, certamente teria sofrido intervenção federal (art. 34, VII, e), o que seria facilmente detectável pelo Tribunal de Contas.Realmente, a banalização da ação popular para hipóteses além da Constituição não traz qualquer ganho de ordem pública ao contrário, apenas tumultua a gestão pública, não se conferindo a qualquer cidadão, isoladamente, pretender impor obrigações de caráter geral ao PoderPúblico, sob argumento de omissão de dever constitucional.Desta feita, reputo que a litigância de má-fé foi corretamente reconhecida pela r. sentença, uma vez que restou devidamentecaracterizado o uso abusivo do direito de iniciativa da ação popular, em nítidadesconformidade com o que intentou o legislador, notavelmente com fins de obtenção de proveito próprio.Caso a ocorrência de atos lesivos em desfavor da municipalidade fosse motivo de tormento na vida do autor, ou mesmo que a insurgência decorresse unicamente de um sentimento de indignação (vale dizer, o autor, profissional de advocacia, em que pese se dizer coordenador do 'Observatório da Transparência', não comprovou tal declaração por documentos, ajuizamento a ação unicamente em seu próprio nome), seria mais do que recomendável que o autor, antes de ingressar com a ação popular, interpelasse a Administração Municipal para a obtenção de melhore resudados, ou seja, informações concretas, inclusive mediante documentos, ou também que aquele poder público lhe apresentasse esclarecimentossuficientes sobre os repasses de verbas públicas cabíveis pelo Estado.Porém, o autor agiu em sentido absolutamente contrário, optando por assumir a conduta de apenas “deduzir” que os repasses em questão estavam em atraso, sem que para isso angariasse elementos suficientes e aptos a formar a convicção de outrem", concluiu o acórdão

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