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Ser testa de ferro ou laranja não configuram crime tributário



A Justiça de Fernandópolis absolveu um comerciante acusado de crime tributário , ocorrido no inicio dos anos 2000. C.P foi acusado de lavar notas de açougues em nome de um frigorífico que não existe mais em Fernandópolis. O Ministério Público do Estado de São Paulo ofereceu denúncia contra C.P qualificado por ter praticado o delito tipificado no artigo 1º,III, da Lei nº 8.137/90 (crime tributário), por dezessete vezes em continuidade, na forma do art. 71, do Código Penal.Narrou a denúncia que entre 19/05/2001 e 09/05/2002, o acusado, sócio proprietárioda de uma empresa de carnes , ao emitir notas fiscais faturas consignando declarações falsas quanto aos estabelecimentos de destino, suprimiu ICMS, no totalde R$ 10.753,58. Consta que o denunciado lançou nas notas fiscais operações de venda de mercadoria aos estabelecimentos de frigorificos e açougues (ao todo 17) que totalizaram R$215.054,70. Constatou-se que parte das empresas constantes como supostas compradoras sequer existiam à época das vendas e outra parte negou tivesse firmado o negócio atestado nas notas; o denunciado emitiu notas fiscais e consignou nelas declarações falsas quanto aos estabelecimentosde destino, deixando de recolher o tributo devido e referente às operações, pela natureza e a possibilidade de diferimento (procrastinação do lançamento e do recolhimento do imposto para momento posterior) do seu recolhimento, sendo que neste caso o denunciado buscou, com as falsidades praticas, dar a impressão de transferência da obrigação de recolhimento do imposto para as empresas constantes nas notas, tendo como fato gerador a saídadas mercadorias do seu estabelecimento comercial. A sonegação teria ultrapassado oitenta mil reais e o crime teria sido praticado por mais de dezessete vezes em continuidade.A denúncia foi recebida em 13/08/2009 .O réu foi citado por edital .Em 21/06/11 foi suspenso o processo e o prazo prescricional .Em 17/06/2015 o réu foi preso preventivamente .Em 22/06/2015 revogou-se a suspensão do feito e deu-se o réu por citado,pela juntada de procuração com poderes específicos.Em 22/06/2015 foi concedida liberdade provisória ao réu e este foi cientificado das medidas cautelares a ele aplicadas .O réu apresentou defesa preliminar. Foi confirmado o recebimento da denúncia . A defesa também pediu a improcedência, sob os argumentos de que o real proprietário do estabelecimento emitente das notas fiscais fraudadas era o O.O S. M. e a participação do réu se restringiu em permitir a abertura da empresa em seu nome,em 1998, consoante declarações prestadas à autoridade policial " A pretensão veiculada nesta ação é improcedente.A materialidade do delito restou comprovada pelos autos de infração e imposição de multa. No entanto, como bem ressaltado pelas partes, há dúvida acerca da autoria.Interrogado em Juízo, afirmou que a empresa estava em nome, mas quem administrava era o OS.M. Negou ter participação nas vendas e na emissão de nota fiscal. Destacou que em 1998 havia feito uma cirurgia cardíaca, estava acamado em São José do Rio Preto, quando o M. lhe pediu para abrir uma firma em seu nome para tocar um açougue. Mencionou ter concordado na inocência e na fragilidade, e ter colocado o nome de seufilho. Negou imaginar que o o ex-proprietário ia formar quadrilha. Negou ter tido benefício. Ressaltou que ele lhe prometeu ajuda de R$ 150,00 ou R$ 200,00 porque estava doente, mas não recebeu o benefício. Disse ter sido ouvido na Delegacia e contou o ocorrido. Esclareceu que na primeira vezque foi ouvido não o denunciou porque não sabia. Narrou que está parado e estudou até o 4º ano.Negou saber se houve recurso contra essa autuação. Disse ter feito cerca de 20 a 25 pedidos de verificação com relação a essa empresa.Contou que seu açougue funcionou de 1991 a 2003.Pois bem. De fato, ao acusado foi imputado o crime de sonegação fiscal, na medida em que, na qualidade de sócio de uma empresa“, de forma fraudulenta, emitiu notas fiscais faturas consignando declarações falsasquanto aos estabelecimentos de destino, suprimiu ICMS, no total de R$ 10.753,58.Acontece que o réu negou a fraude ao ser interrogado em juízo e sustentouque agiu “na inocência e pela fragilidade”, pois estava acamado em um hospital de são José do RioPreto, e agiu como “laranja” ou “testa de ferro” Essa negativa não foi contrariadanos autos, ao menos com a certeza que se exige para o decreto condenatório.De fato, durante a instrução foram inquiridas duas testemunhas de acusação,o agente fiscal e um empresário, mas nenhum dos dois detalhou a responsabilidade do réu. Ora o responsável pelo crime de sonegação fiscal, ao menos a princípio, é aquele que figura como sócio da pessoa jurídica e que atua como administrador, praticando atos de gestão a ponto de tornar possível concluir que tem consciência dos atos praticados e, porconsequência de eventuais irregularidades que lá aconteçam, a ponto de responder pelos atospraticados, nos termos do art. 11, da Lei nº 8.137/90.Como bem ressaltado pelo diligente Promotor de Justiça em suas alegaçõesfinais (fl.571), “(...)ainda que se diga que o acusado, de forma livre e consciente, anuiu com a abertura da sociedade empresária em seu nome e em nome de seu filho, tal anuência não significaque aderiu aos crimes a ele imputados na denúncia, sob pena de responsabilização penal objetiva,por ausência de dolo. A mera figuração no contrato social como sócio administrador não bastapara a condenação em crimes contra a ordem tributária(...)”.Sem dúvida, de acordo com documentos juntados a empresa sonegadoraestava em nome do réu. Entretanto, para que fosse considerado responsável pela sonegação seriaimprescindível que viesse prova inequívoca de que atuou de forma ativa na empresa, com vontadelivre e dirigida (com dolo) a fraudar o fisco e a legislação tributária estadual.Esse ônus, não se discute, nos termos do art. 156, do Código de ProcessoPenal, incumbia ao Ministério Público, de quem partiu a acusação de que o réu foi o responsávelpelas transações fraudulentas, mas tal prova não foi produzida durante a instrução do feito.Vale dizer, para a condenação criminal, por tudo de grave que ela acarretapara o cidadão, é imprescindível que exista prova indiscutível de sua responsabilidade. Para tanto,então, não bastam meras suposições, provas contraditórias, pouco esclarecedoras, ou produzidasexclusivamente no inquérito, que façam surgir ao julgador dúvida invencível. Afinal, no processopenal, por aplicação do princípio in dubio pro reo, a dúvida deve favorecer a Defesa.Diante desse conjunto probatório, forçoso concluir que há dúvida razoávelque justifica o reconhecimento do non liquet postulado nas alegações finais.Diante do exposto, julgo improcedente a ação para absolver o réu C.P, qualificado nos autos, da acusação de ter praticado o crime tipificado no art. 1º, inc. III, da Lei 8.137/90, por dezessete vezes, a eleimputada nestes autos, com base no art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal", ratificou o juiz da 1ª Vara Criminal de Fernandópolis Luiz Arnaldo Sazzo Valderama

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