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TJ-SP aumenta pena de réu acusado de matar e ocultar corpo de policial civil



“O júri popular não precisa justificar sua decisão. Por outro lado, referida decisão não pode estar divorciada das provas produzidas nos autos”. Com este entendimento, por unanimidade, a 8ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo aceitou recurso do Ministério Público para anular julgamento que absolveu um homem acusado de matar e ocultar o corpo de um investigador. O colegiado também acolheu pedido do órgão para elevar a pena de um corréu para 25 anos. Isaque Percincula Andrade da Rocha e Cleidison Santos da Silva foram levados a júri popular, em Cubatão, no dia 1º de dezembro de 2020. Os jurados condenaram Rocha, e o juiz Orlando Gonçalves de Castro Neto fixou a sua pena em 15 anos, 4 meses e 24 dias de reclusão, em regime inicial fechado. Em relação a Silva, o conselho de sentença o absolveu do homicídio, por considerar que ele não o cometeu, e ainda o inocentou da ocultação de cadáver, apesar de reconhecer a sua participação neste delito. O MP apelou para elevar a pena de Rocha devido “às circunstâncias judiciais desfavoráveis, à culpabilidade acentuada e aos maus antecedentes do réu”. Ainda pediu a anulação do júri em relação a Silva, a fim de submetê-lo a novo julgamento, porque a decisão dos jurados foi “manifestamente contrária às provas dos autos”. O advogado Felipe Pires de Campos também recorreu e pleiteou a absolvição de Rocha porque a sua condenação afrontou “provas verdadeiramente lícitas produzidas ao longo do processo”. Relatora dos recursos, a desembargadora Ely Amioka destacou que os “juízes leigos expressam seu veredicto com base na convicção íntima que decorre do conjunto das provas, muitas vezes motivados por elementos morais, religiosos, de política criminal, dentre outros”. Porém, em relação à condenação de Rocha, os jurados decidiram “com respaldo nas provas, optando por algumas das teses defendidas pelas partes em plenário”. Deste modo, a julgadora votou pelo improvimento da apelação da defesa. As apelações do MP, ao contrário, foram providas. “A prova oral aponta que o acusado Cleidison [Silva] integraria o grupo de agentes que ceifaram a vida da vítima, após identificarem que este era policial. [...] No caso dos autos, s.m.j., entendo que a decisão absolutória não guardou consonância com o conjunto probatório, no qual se pôde constatar indícios da prática do crime por parte do réu”, observou a relatora. O seu voto foi seguido pelos desembargadores Marco Antônio Cogan e Mauricio Valala. O colegiado também acolheu o pedido do MP para aumentar a pena imposta a Rocha. A relatora Ely Amioka reconheceu que “há culpabilidade exacerbada do agente, evidenciada no dolo mais acentuado da conduta, sobretudo em virtude da existência de três qualificadoras, que, a meu ver, deveriam ter sido sopesadas de maneira mais severa”. Assim, a sentença condenatória deste réu foi reformada para redimensionar a sua sanção para 25 anos, 10 meses e 10 dias de reclusão. Cemitério clandestino Lotado na Delegacia Seccional de Santos e afastado da função havia cerca de dez anos por motivo de saúde, o investigador Anderson Diogo Rodrigues, de 43 anos, foi morto pelo simples fato de ser policial, circunstância que qualifica o homicídio. A sua condição de agente público de segurança foi descoberta ao retirar a carteira do bolso em uma pizzaria na Ilha Caraguatá, em Cubatão, na madrugada de 25 de junho de 2016. Esse simples ato possibilitou que a sua funcional fosse mostrada de modo involuntário. O investigador estava acompanhado da namorada. Pelo menos três homens renderam o investigador e a mulher. O casal foi levado de carro à Vila dos Pescadores, comunidade formada em sua maioria por palafitas. Deste núcleo, apenas o investigador foi conduzido de barco até uma ilha fluvial em uma área de mangue, perto da Vila Esperança. A namorada foi liberada. O corpo de Anderson foi encontrado 32 dias depois, em 27 de julho, em um cemitério clandestino do Primeiro Comando da Capital (PCC). Marcos Matos Souza havia sido preso na véspera. Reconhecido por meio de fotografia como um dos envolvidos no sequestro do investigador, ele se refugiava em uma casa na cidade de Praia Grande, onde foram apreendidos entorpecentes, munições, pistola e revólver. Questionado sobre o crime, ele indicou aos agentes o lugar onde o investigador foi enterrado. Primeiro réu a ser levado a júri, Marcos foi condenado a 20 anos de reclusão, no dia 19 de fevereiro de 2020. Anderson foi enterrado despido e com as mãos na nuca. Perto da cova do investigador havia mais quatro. Uma delas estava aberta e vazia, aguardando o sepultamento da próxima vítima. Nas demais foram encontrados outros três cadáveres de pessoas do sexo masculino. A funcional do policial, outros documentos e até o medicamento que ele tomava foram achados sobre o seu corpo. Uma marca de tiro no RG do agente revela a tortura psicológica que lhe foi imposta nos instantes que antecederam a sua morte. Laudo de exame necroscópico concluiu que a causa da morte consistiu em traumatismo cranioencefálico e múltiplas fraturas, indicativos de tortura e decorrentes de pauladas ou golpes do gênero. Na elevação da pena de Isaque Rocha, a 8ª Câmara de Direito Criminal descreveu esta qualificadora do assassinato: “o crime de homicídio foi cometido com tortura, em face do intenso sofrimento físico e psicológico perpetrado pelos denunciados”. O colegiado também apontou no acórdão as demais qualificadoras. Uma delas é o fato de o homicídio ter sido cometido por ser a vítima investigador. A outra consiste no emprego de recurso que dificultou a defesa do policial civil, devido à superioridade numérica dos criminosos e à impossibilidade de fuga do cativeiro. O MP denunciou um quarto homem pela morte e ocultação do cadáver de Anderson Rodrigues. Porém, antes de ser levado a júri, este réu teve a punibilidade extinta. Ele morreu em 16 de fevereiro de 2021. Processo 0001913-75.2016.8.26.0157

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